alla Filosofia Dialogica, Letteratura, Relazioni Internazionali, Scienze Interculturali, Diritti Umani, Diritto Civile e Ambientale, Pubblica Istruzione, Pedagogia Libertaria, Torah, Kabballah, Talmude, Kibbutz, Resistenza Critica e Giustizia Democratica dell'Emancipazione.



ברוך ה"ה







giovedì 22 giugno 2023

BOLSONARO, TEMER, MORO E COLLOR E A DERROTA DA DIREITA ESTÚPIDA E DA EXTREMA-DIREITA


BOLSONARO, TEMER, MORO E COLLOR E A DERROTA DA DIREITA ESTÚPIDA E DA EXTREMA-DIREITA

por Pietro Nardella-Dellova

Hoje, 22/6/2022, Bolsonaro será julgado pelo TSE – Tribunal Superior Eleitoral, e é provável que aquele Tribunal o julgue inelegível. O conjunto de provas é farto, substancial, público, notório, jurídico: Bolsonaro atentou contra a Democracia, colocou em xeque o sistema eleitoral (diga-se, reconhecidamente, interna ou externamente, como sistema exemplar!). articulou, desde a facada (dizem que falsa!), um golpe.

Golpe encabeçado por ele, e promovido por setores neofascistas e atrasados das Forças Armadas, do sistema especulativo financeiro, dos ruralistas de pouco cérebro e muita voracidade destrutiva, da ala “política” mercenária, dos crentes tipicamente malafaístas, de movimentos expressivamente neofascistas (como o MBL, por exemplo!), da mídia especializada em antidemocracia e, também, de grupos repressores da sexualidade (caso para profissionais da área!).

Bolsonaro é o representante de uma direita burra, emburrecida, idiotizante, e que, há muito, abandonou os padrões (liberais) civilizados de economia, religião e política, e inclinou-se, amarrou-se, colou-se e prendeu-se à extrema-direita com ares nazifascistas! Os apoiadores e representados de Bolsonaro, e promotores do golpismo, estão entre a burrice adorniana (repetição de discursos vazios denunciada por T. Adorno) e a fúria hitlerista e mussolinista.

Mas, Bolsonaro, hoje certamente com sua derrota decidida pelo TSE, é um dos representantes desta extrema-direita (que quer se vender apenas como direita liberal). Michel Temer, Sérgio Moro e Fernando Collor são os outros “escolhidos” para representar o que se tem de pior no Brasil – a extrema-direita maquiada de direita democrática.

Michel Temer, um dos artífices do já reconhecidamente golpe contra o Mandato de Dilma Rousseff (só não é reconhecido por quem defendeu, sem qualquer argumento, o próprio golpe!), foi escolhido para dar existência e corpo aos promotores do golpismo. Com ele estavam todos os promotores do golpismo posterior (o golpe dentro do golpe), entre os quais, a ala neofascista dos militares! Braga Netto já estava com Temer, não nos esqueçamos! Mas, Temer foi derrotado, está derrotado, e saiu com os mais baixos índices de popularidade. Sua idade (e ligações) impede sua prisão!

Sérgio Moro, como se sabe, foi “condenado” como juiz suspeito. Era o escolhido pela extrema-direita para ocupar o lugar de Bolsonaro (a saída antecipada do Ministério da Justiça foi teatral, até porque não apenas se manteve ligado a Bolsonaro, como fez campanha e assessoria eleitoral para Bolsonaro). Moro foi “construído” com uma máscara de “herói” contra “corruptos” desde a farsa da Lava-Jato, cujo objetivo era a prática da “lawfare” contra um alvo específico: Lula. Moro está meio vivo, meio morto: zumbi!

Moro foi “construído” pela extrema-direita do mesmo modo que Fernando Collor. O discurso colocado em suas bocas (nada democráticas, honestas ou justas) era contra o comunismo (comunismo?!), contra a corrupção (corrupção?!) etc. Ambos condenados: Moro por suspeição (e há mais investigações em curso que envolvem bilhões na 13ª Vara, assim como denúncias de Tony Garcia e Tacla Duran); Collor, finalmente, por corrupção!

Voltando a Bolsonaro, o último representante dos promotores do golpe dentro do golpe, hoje ele será julgado inelegível pelo TSE. Dezenas de outras investigações seguem, incluindo crimes de genocídio no Tribunal Penal Internacional, o caso das joias sauditas, os bilhões da Caixa, a falsidade das carteiras de vacinação etc. e, finalmente, o golpismo de 8 de janeiro de 2023.

O que há de comum entre Bolsonaro, Temer, Moro e Collor, além da expressa antidemocracia, ódio aos trabalhadores, ataques diretos e indiretos à CF/88, inclinações militares ao golpismo, violência contra a economia, misoginia e corrupção intrínseca? Todos eles são representantes, construídos e mascarados pela extrema-direita (que já foi mais oculta e, hoje, anda à luz do dia e nas mídias desavergonhadas)! Mas, não só. Todos eles representam, com suas condenações políticas, econômicas e jurídicas, a derrota da extrema-direita!


© Pietro Nardella-Dellova é Doutor em Direito pela Universidade Federal Fluminense, Mestre em Filosofia do Direito pela USP. Doutor e Mestre em Ciência da Religião pela PUC/SP. Pós-graduado em Direito Civil e Literatura. Formado em Direito e Filosofia. Atualmente, desenvolve estudos no Programa de Pós-graduação da Universidade Hebraica de Jerusalém. É Professor de Direito da Escola da Magistratura e Pesquisador CNPq/PUC-SP. É autor de vários livros jurídicos e coordenador da Revista de Direito Civil (publicada pela Faculdade Padre Anchieta). É poeta, membro da UBE e da Accademia Napoletana per la Cultura di Napoli, com vários livros de poesia.

 

 

lunedì 24 gennaio 2022

O CASO LÚCIA HELENA ISSA: O ANTISSEMITISMO DESAVERGONHADO, por Pietro Nardella-Dellova



O CASO LÚCIA HELENA ISSA: 
O ANTISSEMITISMO DESAVERGONHADO(1)

por Pietro Nardella-Dellova (2)


No dia 20 de janeiro de 2022, no Programa Um Tom de Resistência, da TV247, a senhora Lúcia Helena Issa manifestou seu profundo ódio aos Judeus e Judias, divulgando inverdades e absurdidades contra o Povo Judeu. Enfim, abriu sua maleta de monstruosidades e, sem qualquer pudor ou vergonha, e sequer critério, manifestou ao mundo o seu antissemitismo.

 

A senhora Issa confunde, entre outros aspectos, Judeus com Israelenses, Israel com Povo Judeu, Governo de Israel com Israel e um conflito que, de início era Israel-Árabe (ela desconhece isso, aliás, ela e outros antissemitas) e que se tornou, por variados motivos, um conflito Israel-Palestina. O antissemita, e a senhora Lúcia Helena Issa é antissemita, comumente cria uma situação externa, fakerizada, rasa, sem fundamento, a fim de legitimar seu ataque antissemita. Foi assim com os primeiros antissemitas medievais, foi assim com o mussolinismo, foi assim com o hitlerismo e, hoje, é assim com o conflito (ou causa) Israel-Palestina. Não se trata, da parte dela, de uma análise lógica, histórica, geopolítica, econômica, jurídica, imparcial, religiosa etc. Não, trata-se de escandaloso antissemitismo que começa, e termina, em ódio aos Judeus e Judias.

 

Nesse sentido pouco importa, digo, nada importa, que a mesma senhora Lúcia Helena Issa diga que “tem amigos Judeus”. É, comumente, um método de dizer: sou antissemita, mas tem algum Judeu que me apoia. Já ouvi isso, inclusive, em encontros Inter-religiosos (que promovo e apoio). Certa vez, ouvi: “você é um Judeu diferente, muito simpático e humanista”. Fosse um desavisado, raso e sem critério para ouvir, pensaria orgulhosamente: “sou foda”. Mas, não, a fala “você é um Judeu diferente, muito simpático e humanista” não é um elogio a mim, ou a outro Judeu, mas um ataque, claro e inescondível, antissemita. O mesmo fez a senhora Issa ao dizer que “tem amigos Judeus”. Ela quer dizer que, mesmo tendo algum amigo Judeu, está autorizada a ser antissemita.

 

Sobre Israel e Palestina, a senhora Issa demonstra não apenas ignorância, e uma visão osmótica, acrítica, irresponsável e militante do baixo clero, como sói acontecer nesse tema, mas uma ignorância perigosa, violenta, propagadora de ódio e, por fim, de uma “autorização legítima” (pois ela se considera uma autoridade sobre o tema) para que todos que a ouvem, seguem e defendem, possam, também, odiar os Judeus e Judias pelo mundo. É um discurso que conhecemos desde muitas décadas: a normalização do ódio aos Judeus e Judias.

 

Não há em sua fala, no referido programa (com algum atraso, retirado do ar pela TV 247) qualquer demonstração de conhecimento. É o discurso oportunista aparentemente a favor de um povo, o Palestino, mas, insincero, demagógico e hipócrita, que não prevê sequer a composição dialógica entre Israelenses e Palestinos. Não há em sua fala qualquer demonstração de conhecimento histórico e das muitas facetas que levaram ao conflito. É oportunismo barato, em nome de uma “esquedopatia” que não se constrói no conhecimento, mas no discurso lançado sem responsabilidade. Aliás, é a esquerdopatia que envergonha a própria Esquerda - séria e combativa.

 

Não sabe a senhora Issa que Israel é, sim, um país legítimo, assim como deve ser a Palestina. Não sabe a senhora Issa que Israel nasce, não do imperialismo estadunidense (discursinho vagabundo!), mas da melhor Esquerda existente naquelas terras: o socialismo buberiano, o anarquismo de Landauer, os valores libertários do proudhonismo, enfim, o movimento kibutziano, cuja organização foi, desde 1870, explicitamente socialista, anarquista, progressista, construtiva, pluralista.  Não sabe a senhora Issa que, diferente do discursinho raso de “imperialismo regional”, os Estados Unidos não apoiaram a criação de Israel, mas, sim, a comunista União Soviética.

 

Não sabe a senhora Issa que há, sim, grupos judaicos e Israelenses (e não é pequeno nem inexpressivo) que defendem, dentro e fora de Israel, a criação do Estado da Palestina ao lado do Estado de Israel, como conclusão óbvia, jurídica, nacional e internacional. Não sabe a senhora Issa que há, sim, muitos Palestinos, que defendem a existência de Israel, assim como a criação de seu próprio Estado – Palestina. Não sabe a senhora Issa que há não um, nem dois, mais muitos grupos palestinos, entre os quais, Hamás e Fatah, que não se confundem. Não sabe a senhora Issa que o discurso do Hamás, alinhado a um interesse geopolítico iraniano, é de destruição completa de Israel, enquanto o do Fatah é de composição e diálogo com Israel. Não sabe a senhora Issa que em Gaza há um governo do Hamás, e na Cisjordânia, um governo do Fatah.

 

Pouco, aliás, nada, sabe a senhora Issa sobre Israel e Palestina, e como toda voz sem conhecimento, e muita saliva, torna-se vazia, destrutiva, odiosa ao disseminar incontido ódio antissemita.

 

Apesar da fala, mais uma fala, da senhora Lúcia Helena Issa, aberta e desavergonhadamente antissemita, continuamos, nós Judeus e Judias progressistas, na defesa da criação de um Estado palestino, na integridade e desenvolvimento do povo Palestino, na defesa de seus direitos e, não menos, na defesa dos direitos dos Israelenses. Continuamos defendendo a coexistência de dois Estados, de dois Povos. Em que pese sermos parte dessa luta, não estamos desatentos do antissemitismo, em suas muitas faces, sendo uma, comumente utilizada, o antissionismo.

 

Não, ser antissionista não é, por si só, um antissemitismo, até porque não há um único sionismo. O que ocorre é que, assim como outras maquiagens do antissemitismo, por exemplo, as citadas mussolinista e hitlerista (tratando falsamente de raça e economia), o antissionismo (geralmente utilizado por quem, assim como pela senhora Issa, nada entende de sionismo) é a atual máscara, pintura política, colorido, que tenta esconder o antissemitismo. Nesse sentido, o antissionismo é, não poucas vezes, um antissemitismo mascarado. No caso das falas da senhora Lúcia Helena Issa, ficou claro que, embora valha-se dessa máscara “antissionista”, no mais, e em quase tudo, mostrou um aberto e desavergonhado antissemitismo que deve ser, sem reservas, combatido.

 

Nós, Judeus e Judias progressistas, lutamos contra o antissemitismo assim como lutamos contra a islamofobia, homofobia, misoginia, machismo, racismo, exploração do trabalhador, destruição do meio ambiente, trumpismo, salvinismo, bolsonarismo e neopetencostalismo político. Lutamos, também, contra os discursos de ódio anti-Palestina e anti-Israel. E lutamos contra a mentira, o falseamento das pautas, a esquerdopatia rasa e acrítica que, no mais das vezes, revela a osmose, a repetição, a falta de substância argumentativa, enfim, como escreveu Theodor Adorno, a burrice. No caso da senhora Issa, não apenas burrice, mas uma burrice perigosa e destrutiva – a antissemitismo.

 

© Pietro Nardella-Dellova

1) O presente texto foi primeiramente publicado no A VOZ DA ESQUERDA JUDAICA https://avozdaesquerdajudaica.com.br/2022/01/24/o-caso-lucia-helena-issa-o-antissemitismo-desavergonhado/

    

    NOTA: sua utilização é liberada, desde que, e apenas se, indicada a autoria e dados de publicação original (acima)

 

2)                                                  2)     Dados do autor ao final do texto.

 

Pietro Nardella-Dellova é Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, UFF, e Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da USP – Universidade de São Paulo; é Doutor e Mestre em Ciência da Religião pela PUC/SP; é Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil; é Pós-graduado em Literatura; é Formado em Filosofia, e é Bacharel em Direito. É membro efetivo da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB/SP – São Paulo; Membro da Comissão de Notáveis da OAB/BC, Balneário de Camboriú, Santa Catarina; Membro da “Accademia Napoletana per la Cultura di Napoli”, Nápoles, Itália; Associado ao Grupo Martin Buber, de Roma, para o Diálogo entre Israelenses e Palestinos; Associado ao Grupo “Judeus Pela Democracia” (Israel, USA e Brasil). É Autor de vários livros, entre os quais, Antropologia Jurídica (2017); Direito, Mito e Sociedade (2021) e Pierre Proudhon e o Direito Civil: Teorias da Propriedade como “droit d’aubaine” e como função libertária (2021); A Crise Sacrificial do Direito, 2000; Judaísmo e Direitos Humanos, 2022 (prelo). É autor de centenas de artigos e pareceres jurídicos; é Poeta, com vários livros de Poesia publicados, e membro da UBE – União Brasileira de Escritores (São Paulo), assim como da Accademia Napoletana (Napoli). Em 2004, criou e coordenou o CPPJ – Centro de Pesquisa e Prática Jurídica “Prof. Goffredo Telles Jr.”. Em 2011 criou e coordenou o Grupo de Estudos e Pesquisas NUDAR – Teorias Críticas Aplicadas ao Direito Privado. É Pesquisador do Grupo de Pesquisa TC TCLAE CNPq, e Coordenador, no mesmo Grupo, da Linha de Pesquisa “Direito Civil Constitucional, Teorias Críticas e Educação Jurídica”. É Pesquisador do Grupo de Pesquisa VEREDAS PUC/SP-CNPq sobre Religião e Direito. É Professor, desde 1990, de Literatura, Direito Civil, Filosofia, Direito Processual Civil e Direitos Humanos em vários cursos (graduação e pós-graduação), entre os quais, Universidade Federal Fluminense; ESA – Escola Superior da Advocacia; EMERJ – Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Atuou como Professor visitante (2011-2013) na Faculdade de Direito da USP, abordando o tema “Direito Hebraico Comparado”. Foi Pesquisador bolsista CAPES/FUNDASP no Programa de Estudos Pós-graduados da PUC/SP. Atualmente, além das atividades docentes no Brasil, desenvolve estudos e pesquisas em New York, USA.

Pietro Nardella-Dellova é Colunista na página A VOZ DA ESQUERDA JUDAICA https://avozdaesquerdajudaica.com.br/author/dellova/

Contato: pietrodellova2014@gmail.com

 

foto: Lúcia Helena Issa

 


 

mercoledì 12 gennaio 2022

DIREITO CIVIL E CONSTITUIÇÃO: DIREITO CIVIL EM CHAVE HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL, por Pietro Nardella-Dellova

 

DIREITO CIVIL E CONSTITUIÇÃO: DIREITO CIVIL EM CHAVE HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL (1)

Prof. Dr. Pietro Nardella-Dellova (2)

O Direito Civil desde as suas origens romanas e, em especial, após a Revolução Francesa (1789), manteve um caráter privatístico, sobretudo nos sistemas codificados. Muitos assuntos, entre os quais, o sujeito de direito, os bens, os fatos jurídicos, as obrigações, contratos, direitos reais, sucessões e até mesmo família, foram mantidos em um contexto de direito privado, quase que exclusivamente romano, como ensina Arguello, a redação dos vários Códigos manteve a estrutura e as ideias romanas:

“En efecto, nuestro Código Civil (...) resultó uma obra de contenido esencialmente romano. A través de su articulado y de sus notas se aprecia que una gran masa de conceptos romanos se hallan consagrados em dicho ordenamiento (...)”(3)

 As relações jurídicas, de caráter civil, eram tratadas no sistema privado, e nele mantidas. Mas, esse modelo demonstrou-se esgotado, tendo em vista que, apesar da origem romana, as sociedades contemporâneas não são romanas, e sim multifacetadas, plurais e em plena diversidade. Além disso, não apenas não são sociedades romanas (embora romanizadas!), mas não têm as mesmas bases sociais, econômicas, religiosas e geográficas que aquelas dos romanos.

Por isso mesmo, muitos dos antigos institutos do Direito Romano foram submetidos aos critérios hermenêuticos modernos, critérios esses com valor principiológico constitucional. Não se pode falar em aplicação simples e pura dos institutos romanos sem que os mesmos sejam adequados e entrem em harmonia com a realidade dos tempos atuais

Por exemplo, não se pode simplesmente falar em pacta sunt servanda (princípio da obrigatoriedade dos contratos) sem levar em consideração alguns aspectos: tempo do contrato, tempo da manifestação de vontade e condições socioeconômicas e, por isso mesmo, o princípio pacta sunt servanda, embora continue valendo, é submetido a outro princípio: rebus sic stantibus (enquanto as condições se mantiverem tais como as do momento em que a manifestação de vontade manifestou-se). Ao tempo romano havia certa estabilidade nas relações contratuais, o que não se verifica nos dias de hoje.

 Ademais, tendo havido, como há, um princípio de autonomia de vontade, o mesmo submete-se a outro princípio, agora, supremacia da ordem pública. A vontade não pode ser considerada em toda a liberdade, pois está sempre no contexto social e, neste caso, há uma ordem pública a ser considerada. Some-se a todos os princípios clássicos, o da boa-fé, não mais subjetiva, mas objetiva, ou seja, muito mais próxima do que os romanos chamavam de honest viverem isto é, viver cumprindo o papel social. No dizer de Luis Edson Fachin

“quem contrata não contrata mais apenas com quem contrata, e quem contrata não contrata mais o que contrata; há uma transformação subjetiva e objetiva relevante nos negócios jurídicos. O novo Código traz a função social do contrato e os princípios de probidade e boa-fé.”(4)

             Porém, no avançar do processo de constitucionalização, os direitos humanos de qualquer dimensão ou geração, uma vez conquistados, foram se tornando direitos fundamentais, inseridos no texto constitucional como núcleo (imutável) do projeto constitucional de país. Enquanto o movimento dos direitos humanos continua, sem fim, os direitos fundamentais foram se registrando como conquistas constitucionais.

            Tais direitos dão o caráter do projeto de país que se deseja. Uma vez na Constituição Federal, são direitos formais, textuais. Na medida em que se concretizam, tornam-se direitos concretos. Em outras palavras vão adquirindo um caráter de constituição real da sociedade.  E, neste sentido, conforme dispõe o texto constitucional, tais direitos têm aplicação imediata em quaisquer relações jurídicas, sociais, políticas e econômicas.

            Assim como os direitos humanos foram se cristalizando no texto constitucional, as várias constituições, mormente, após o final da Segunda Guerra Mundial, foram ampliando seu raio de interferência para além da organização política e econômica do Estado, e alcançando setores até então privativos e objeto dos Códigos Civis, como propriedade, obrigações e família.

            No caso do Brasil, a Constituição Federal de 1988, chamada de Constituição Cidadã, abriu um universo de repercussão no direito privado, ora com aplicação imediata, ou seja, diretamente no texto constitucional, ora como fundamento hermenêutico.

            Alguns autores, e juristas, chamam o novo Direito Civil de Direito Civil-Constitucional. Da minha parte, não vejo exatamente um Direito Civil-Constitucional, pois entendo que se mantêm as esferas de cada uma das Leis, mesmo sendo uma delas a Lei Maior, a Carta Magna. Porém, não é possível deixar o Direito Civil isolado, autônomo e autogestivo.

Há, sim, hoje uma hermenêutica expressivamente constitucional, criando-se um tipo de hermenêutica proativa que, entre outros aspectos, leva a uma compreensão constitucional do direito infraconstitucional. Mas, tal comportamento, a que chamo ética constitucional, não é simplesmente uma aplicação de princípios constitucionais como se fossem outros princípios, mas da realização do espírito constitucional. Tepedino defende tese semelhante:

“As relações entre a Constituição e o Direito Civil não podem ser reduzidas, portanto, a um problema de técnica legislativa. E a chamada constitucionalização do Direito Civil não coincide, como pretendem alguns, com uma utilização fugaz de princípios constitucionais por parte da magistratura, enquanto faltavam soluções legislativas específicas. Cabe à  magistratura – agora ainda com mais vigor, tendo em conta a nova codificação – harmonizar as fontes normativas, a partir da compreensão desta imbricação irreversível entre a legislação infraconstitucional e a Constituição, a ser diretamente aplicada às situações disciplinadas pelo Código Civil.”(5)

             Poder-se-ia dizer que o direito civil, mantendo-se ainda civil e privado, não obstante nasce na Constituição Federal e, em movimento dinâmico (o que o difere do antigo direito civil), traz em seus dispositivos as marcas e a substância constitucional. No mesmo sentido, Caio Mário trata de um direito civil constitucional nos seguintes termos:

“Diante da primazia da Constituição Federal, cujos valores se espraiam por todos os setores do ordenamento, unificando-os, os direitos fundamentais passaram a ser dotados da mesma força cogente nas relações públicas e nas relações privadas e não se confundem com outros direitos assegurados ou protegidos por lei.”(6)                              

            É o que se verifica, por exemplo, no caso da propriedade que, ainda sendo mantida sua natureza de instituição privada, ganhou um aspecto constitucional: a função social. A propriedade, garantida no Direito Civil, é também garantida na Constituição, aliás, como direito fundamental, mas ali mesmo, na Constituição apenas se justifica quando anda de mãos dadas com a função social. De um lado, o direito individual; do outro, a responsabilidade social.

            Não é diferente no que concerne ao direito privado empresarial, também criado e desenvolvido na iniciativa privada e na autonomia societária privada. Porém, a iniciativa privada, uma vez que a organização socioeconômica brasileira é liberal e constitucional, deve ater-se aos dispositivos constitucionais do Artigo 170 da CF/88. É livre a iniciativa, desde que obedecido o princípio de respeito ao consumidor, ao direito do trabalho, ao meio ambiente, à dignidade da pessoa humana e, ainda aí, o principio da função social da Empresa ou atividade econômica.

            Outro aspecto importante do então chamado Direito Civil-Constitucional que, como dito acima, preferimos como Direito Civil em chave hermenêutica constitucional, refere-se à pessoa humana. Vejamos. Na dimensão privatística, a pessoa não passa de sujeito de direito e de obrigações. A pessoa no Direito Civil e Processual Civil, ainda que natural, anda ao lado da pessoa jurídica e da personalidade anômala. São sujeitos de direito! Mas, com o advento da Constituição Federal de 1988, descortinou-se outra dimensão, um quarto conceito, mais amplo, de pessoa: a pessoa humana.

            Agora, não apenas há uma pessoa humana, mas a mesma carrega consigo, intrinsecamente, a dignidade. A Constituição trata isso como princípio fundamental para a manutenção do próprio Estado Democrático de Direito (Artigo 1º, III, CF/88). Diante da CF/88, há as pessoas, sujeitos, e há, agora, a pessoa humana, cujo conceito e amplitude é muito maior. Tão maior que influenciou o texto do Novo Código Civil (2002), trazendo dispositivos como os que se referem aos Direitos da Personalidade.

            É a mesma dignidade da pessoa humana, consagrada na Constituição, que abrirá caminho para a compreensão das obrigações no modo humano ou, se quisermos, a humanização das relações obrigacionais. Um dos efeitos deste fenômeno de constitucionalização das relações privadas verifica-se nos bens penhoráveis e, acima de tudo, na Lei 8009/90 (posterior, portanto, à CF/88) cujo texto é fruto da humanização. Agora, embora o direito do credor deva ser respeitado, o mesmo credor segue os passos de uma ética constitucional quando deve fazer valer o seu direito.(7)

            Como outro exemplo desse processo de constitucionalização do direito privado, ou de nova hermenêutica constitucional para o direito privado, até mesmo a Usucapião (familiar) prevista no (novo) Artigo 1240-A, do CC/02, foi pensada e implementada com base na dignidade (constitucional) da pessoa humana. Não se podia mais suportar, por conta de questões religiosas, que uma pessoa abandona (no sentido jurídico do termo), tivesse que amargar, não apenas o próprio abandono, mas, depois, ainda a perda ou supressão parcial dos bens, mormente imóveis para moradia. Aqui se juntaram dois princípios constitucionais: dignidade da pessoa humana e direito à moradia (ambos compondo o contexto dos direitos fundamentais).

            Uma das áreas, tradicionalmente civilísticas, que mais sentiu a influência da Constituição, foi a do Direito de Família. Hoje, chamada de Direito das Famílias,(8)  ainda por constitucionalização do termo, esta área incorporou textos constitucionais completos, ampliou o reconhecimento dos vários núcleos familiares, estabeleceu o afeto como valor jurídico e, a partir daí, passou a caracterizar as relações socioafetivas, inimagináveis em outras épocas!

            Por exemplo, o que era concubinato (com todo o preconceito desse termo) tornou-se união estável no Artigo 226 da CF/88. Se o concubinato trazia dissabores aos pares, com forte julgamento negativo por parte da sociedade, a união estável foi alçada à dignidade matrimonial.

            O mesmo se diga dos filhos, anteriormente discriminados pelas formas mais abusivas, são considerados, hoje, em pé de igualdade. Todos os filhos são iguais, proibidas quaisquer discriminações. É o que dispõe a CF/88, o Código Civil e o ECA – Estatuto da Criança e Adolescente. Todos esses instrumentos legais são posteriores à CF/88 e por ela influenciados.

            Os exemplos se multiplicam, mas o objetivo do presente texto é dar um sinal a título de estímulo ao debate, e, claro, não esgotar os temas, uma a um. Por isso mesmo, finalizamos apontando um critério de pensamento, de pensar (do latim, pensare, isto é, colocar nos pratos da balança). Se não se pode falar em Direito Civil-Constitucional, mantida a natureza do Direito Civil, não obstante não se pode mais falar apenas Direito Civil. Urge um conceito que tenha como referência o Direito Civil em chave constitucional, ou um Direito Civil no contexto da Constituição.

© Pietro Nardella-Dellova

 

NOTAS BIBLIOGRÁFICAS DAS CITAÇÕES

(1)     O presente texto pode ser livremente utilizado desde que citada a fonte e atribuídos os créditos ao autor.

(2)     Dados do autor ao final do texto

(3)     Luis Rodolfo Argüello. Manuel de Derecho Romano. 3ª ed., Buenos Aires: Astrea, 1997, p. 5;

(4)     Luiz Edson Fachin. Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo. 2ª ed.. RJ: Renovar, 2006, p. 2;

(5)     Gustavo Tepedino. Temas de Direito Civil. Tomo II. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 384-385

(6)     Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de Direito Civil. Introdução ao Direito Civil – Teoria Geral do Direito Civil. Vol. I. 29ª edição revista e atualizada por Maria Celina Bodin de Moraes. Rio de Janeiro: Forense/Gen, 2016, p. 20;

(7)     Glaucia Correa Retamozo Barcelo Alves: “Sobre a Dignidade da Pessoa”, in Judith Martins-Costa (org.): A Reconstrução do Direito Privado, São Paulo: RT, 2002, p. 2015 e segs.;

(8)     Importante obra neste sentido: Maria Berenice Dias. Manual de Direito das Famílias. 11ª edição. São Paulo: RT, 2016;

 

NOTA BIOGRÁFICA DO AUTOR


Pietro Nardella-Dellova é Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, UFF, e Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da USP – Universidade de São Paulo; é Doutor e Mestre em Ciência da Religião pela PUC/SP; é Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil; é Pós-graduado em Literatura; é Formado em Filosofia pela FECS, e é Bacharel em Direito pela FDSBC. É membro efetivo da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB/SP – São Paulo; Membro da Comissão de Notáveis da OAB/BC, Balneário de Camboriú, Santa Catarina; Membro da “Accademia Napoletana per la Cultura di Napoli”, Nápoles, Itália; Associado ao Grupo Martin Buber, de Roma, para o Diálogo entre Israelenses e Palestinos; Associado ao Grupo “Judeus Pela Democracia” (Israel, USA e Brasil). É Autor de vários livros, entre os quais, Antropologia Jurídica (2017); Direito, Mito e Sociedade (2021) e Pierre Proudhon e o Direito Civil: Teorias da Propriedade como “droit d’aubaine” e como função libertária (2021). É autor de centenas de artigos e pareceres jurídicos; é Poeta, com vários livros de Poesia publicados, e membro da UBE – União Brasileira de Escritores (São Paulo), assim como da Accademia Napoletana (Napoli). Em 2004, criou e coordenou o CPPJ – Centro de Pesquisa e Prática Jurídica “Prof. Goffredo Telles Jr.”. Em 2011 criou e coordenou o Grupo de Estudos e Pesquisas NUDAR – Teorias Críticas Aplicadas ao Direito Privado. É Pesquisador do Grupo de Pesquisa TC TCLAE CNPq, e Coordenador, no mesmo Grupo, da Linha de Pesquisa “Direito Civil Constitucional, Teorias Críticas e Educação Jurídica”. É Pesquisador do Grupo de Pesquisa VEREDAS PUC/SP-CNPq. É Professor, desde 1990, de Literatura, Direito Civil, Filosofia, Direito Processual Civil e Direitos Humanos em vários cursos (graduação e pós-graduação), entre os quais, Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Direito Padre Anchieta, ESA – Escola Superior da Advocacia, Pós-graduação em Direito da UNIMEP; EMERJ – Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Atuou como Professor visitante (2011-2013) na Faculdade de Direito da USP, abordando o tema “Direito Hebraico Comparado”. É Pesquisador bolsista CAPES/FUNDASP no Programa de Estudos Pós-graduados da PUC/SP. Atualmente, além das atividades docentes no Brasil, desenvolve estudos e pesquisas em New York, USA.

Contato: pietrodellova2014@gmail.com



mercoledì 5 gennaio 2022

POR QUE LULA? por Pietro Nardella-Dellova

 

POR QUE LULA?


Por que Lula outra vez? Não estaria na hora de Lula descansar e deixar outro assumir? Sim, mas ocorre que o Brasil precisa de Lula (muito mais que Lula do Brasil). Sob Temer e Bolsonaro, respectivamente golpista e miliciano, regrediu décadas em todos os aspectos. Não há qualquer setor que não tenha sofrido ataque diuturno desde 2016. Sob Bolsonaro, claro, esta face destrutiva (que também é de Temer) ficou desavergonhada, pública, expressa, perversa, miliciana, de um genocídio continuado. Temer é o vampiro, o escorpião e o abutre; Bolsonaro, por sua vez, é o homem da serra elétrica, o bigato, o zumbi. Ambos, criados, formados e fortalecidos no esgoto social e político do antipetismo.

 

Lula, nesse contexto, é necessário, urgente, imprescindível, é possibilidade de reconstrução e, assim, de viabilizar um legado civilizatório para as próximas gerações. Lula, e nenhum outro, tem capacidade de unir o país em torno de um projeto nacional que é, em qualquer sentido, o projeto constitucional de país. Bolsonaro e Sérgio Moro são faces da mesma cara monstruosa, unidos desde o ventre de modo indivisível, inseparável. Bolsonaro e Moro criaram, juntos, o Estado Destruído do não Direito. Não se trata de uma ideia, de um ponto de vista, de uma opinião – é um fato, histórico! Os outros candidatos são, ou oportunistas, ou arrogantes sem causa, ou desprovidos de qualquer capacidade de união, de projeto, de vigor constitucional, de substância social, tais como Alessandro Vieira (um oportunista), Simone Tebet (desprovida de qualquer capacidade de união e de substância social), Rodrigo Pacheco (desprovido de capacidade de união ou de projeto), Ciro Gomes (um arrogante sem causa) e João Dória (marcado com a presença bolsonarista em seu DNA político, soma de todas as características acima, embora tenha, a seu favor, o apoio à vacina do Butantan contra a COVID-19, claro, nada mais do que seu dever enquanto Governo de São Paulo ao qual se liga o Butatan).

 

E aqui, deixemos claro, não se trata de lulismo, petismo ou messianismo barato. Trata-se de consciência política, ponto de vista analítico, histórico, conjuntural. Trata-se de analisar possibilidades, não a partir de ideias fragmentadas (como ocorre com outros candidatos acima citados) ou a partir de projetos destrutivos já conhecidos e experimentados (o moro-bolsonarismo), mas de algum aspecto conhecido na trajetória de Lula. Lula é o candidato, hoje, para reconstruir o país a partir da Constituição Federal. Por quê? Porque ele tem em seu currículo fatos políticos e de governo, reconhecidos interna e externamente, que o credenciam para o posto de Presidente da República.

 

Mas, é importante, também, levarmos em conta quais são os apoiadores de Lula. Quais são as pessoas que, direta ou indiretamente, estão no contexto de Lula (não do lulismo!).

 

No plano internacional, Lula conta com a simpatia de governos como do alemão Olaf Scholz, do espanhol Pedro Sánchez, do francês Emmanuel Macron, do argentino Alberto Fernández, do chileno Gabriel Boric, do americano Joe Biden (e, claro, de Barack Obama, assim como de quase 80% dos judeus americanos), dos progressistas Israelenses, de grande parte da comunidade judaica democrática mundial (inclui-se a de Israel), entre outros. Lula é considerado no contexto internacional um Estadista e, não poucas vezes, demonstrou sua grandeza nesse plano, incluindo suas passagens, enquanto Presidente, pela ONU.

 

No plano interno, doméstico, Lula conta com o apoio de figuras importantes, como Flavio Dino, Alessandro Molon, Marcelo Freixo, Eduardo Suplicy, de centenas de Senadores e Deputados progressistas (não apenas os petistas) e com possiblidade de formar um Congresso com pluralismo político, e proativo nas questões sociais e com base propícia de governo, de setores inteligentes do empresariado, dos trabalhadores em geral, dos Professores Universitários, dos cientistas (sobretudo, na realidade pandêmica, pois sabem que, fosse sob Lula, o resultado teria sido outro), de José Eduardo Cardozo, da quase totalidade da comunidade judaica progressista brasileira (que não é pouca), dos setores democráticos da Igreja Católica, de metade dos Evangélicos, da quase totalidade dos religiosos de matriz africana, da Advocacia esclarecida e democrática, dos Juristas para a Democracia, de quase todos os Juízes da Associação Juízes para a Democracia, do grupo de policiais antifascistas, e até de setores tradicionais (do velho) PSDB. Parece bastante claro que Lula tem, também, o apoio e as bênçãos do Papa Francisco.

 

Além disso, está historicamente demonstrado que Lula não é comunista (e não haveria qualquer problema se fosse!). Digo que não é comunista para rebater o discurso raso que o “acusa” (sic) de ser comunista e querer transformar o país em uma Venezuela, Coréia do Norte, China etc. Estes países têm sua realidade específica (nada contra nem a favor neste artigo!) e nenhum deles serviu nos dois governos de Lula, nem serve agora, como referência, exemplo ou modelo. Lula seguiu por outro caminho, realmente da social-democracia.

 

Lula é um trabalhista, expressão do PT – Partido dos Trabalhadores, muito mais de Centro-Esquerda (difícil dizer que se trata de um Partido exclusivamente de Esquerda), e tem, como fato demonstrado, respeito absoluto pelos princípios e valores constitucionais, sobretudo, pelos Direitos Fundamentais. Lula, na América Latina, é um elemento agregador (conforme exige a Constituição Federal). No mundo, Lula é um Estadista comprometido com a Democracia, processos civilizatórios, Direitos Humanos Internacionais, solução pacífica de conflitos (conforme exige a Constituição, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos e outros Tratados, Acordos e Pactos Internacionais). Mesmo em se tratando de governos criticados, Lula obedece à Constituição Federal que determina respeito à autonomia dos povos.

 

E por que Lula teria condições para governar? Além de tudo o que foi acima exposto, pelo simples fato de Lula ter currículo e fatos. Lula não é uma ideia (discordo dessa coisa!), é um fato, um registro histórico. Os governos de Lula foram os melhores com avaliação de começo, duração e final. E aqui, não se trata de ponto de vista político, mas econômico, assim reconhecido por vários setores e agentes, entre os quais, os próprios liberais. É incontestável que Lula fez ótimos governos. Isso não é exercício de futurologia, mas de análise de fatos históricos, econômicos, estruturais, institucionais. Qualquer pessoa com o mínimo de visão administrativa (inclusive, empresarial), vê, observa, analisa e leva em consideração um currículo de um candidato. Até nos contratos particulares, privados, de Mandato, em função do qual se outorgam poderes em Procuração, leva-se em conta o todo do Representante. Não seria diferente no que respeita ao “contrato social”, ao contrato público de governo (e de governança!)

 

Não seria necessário, mas é bom reafirmar que Lula foi considerado inocente em todos os processos movidos contra ele. Por inocente, consideramos qualquer pessoa sem condenação criminal, conforme o Artigo 5º, inciso LVII, da CF/88. Não há contra Lula qualquer condenação! Isso é o Direito! Portanto, não importa a osmótica repetição maledicente dos seus detratores, geralmente dos setores pouco esclarecidos, pouco informados ou, ainda, dos grupos que pretendem o poder pelo poder (caso, por exemplo, de Aécio Neves, João Dória, Sérgio Moro, família Bolsonaro e respectivos). Explico, em uma frase: Lula é inocente; Moro foi julgado suspeito! Punto e basta!

 

O que esperar de um eventual governo de Lula?

 

Primeiramente, o equilíbrio econômico (constitucional) entre os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (disposição dos Artigos 1º, IV, e 170 da CF/88), respeito e incentivo à produção nacional, respeito e incentivo à produção agrícola familiar e, também, do grande agronegócio, respeito e incentivo às indústrias nacionais que, todos sabemos, são as que podem gerar empregos efetivos.

 

No plano da Educação, um incremento robusto (como já fez em seus governos passados), tanto nas Universidades Públicas quanto Privadas (sim, também as Privadas que, sob seu governo puderam atender a milhões de estudantes). Lula inaugurou várias Universidades Federais e não há histórico de ter retirado verbas da Pesquisa em Ciência e Tecnologia, muito pelo contrário. O país precisa de Educação sólida e substancial, o que pressupõe investimento sério (e constitucional) no Ensino e na Pesquisa. Repetir o óbvio é necessário: a grandeza de um país começa e se  mantém a partir da Educação e da Pesquisa.

 

Quanto ao Estado e sua estrutura institucional, espera-se de Lula, à luz do que já demonstrou em seus governos, respeito entre Poderes e na estrutura estatal. Mas, com um acréscimo, espera-se de Lula, não apenas o respeito exigido de um Presidente, mas, agora, a reconstrução, a costura, o fortalecimento e o diálogo institucional, rompido pelo moro-bolsonarismo. Espera-se que os órgãos de Estado, como a PF, Forças Armadas, MP, Agências, Universidades Federais etc, sejam reconduzidas à sua autonomia plena e independência administrativa, a fim de realizarem o que deles se espera constitucionalmente. O moro-bolsonarismo destruiu esta autonomia, e tornou esses órgãos, ou constante “saco de pancada” ou grupos milicianos a serviço de um governo reconhecidamente anticonstitucional, antidemocrático e destruidor.

 

Espera de Lula, em sintonia com o mundo, a proteção inegociável do Meio Ambiente, com utilização inteligente e sustentável dos recursos naturais. Espera-se o combate efetivo e determinado à grilagem, ao garimpo ilegal, à pecuária agressiva e ilegal, ao desmatamento criminoso. Espera-se de Lula a proteção integral dos povos originais. Espera-se de Lula a proteção integral dos grupos religiosos, das diversidades. Espera-se de Lula que propicie o diálogo inter-religioso, intercultural e a proteção efetiva das minorias. Espera-se de Lula o combate diuturno ao racismo (todas as formas de racismo), à misoginia, à homofobia, ao antissemitismo, à islamofobia, à precarização dos direitos dos trabalhadores, ao desrespeito aos aposentados. Enfim, espera-se de Lula o que Lula já fez, com o acréscimo de que, agora, o cenário é de reconstrução de um país arrasado pelo moro-bolsonarismo. Nada disso espera-se dos seus concorrentes (e nem considero aqui Moro ou Bolsonaro, cujo destino deve ser o de responder judicialmente pelos seus atos ilícitos e, em alguns casos, criminosos). Não há, no discurso e no currículo dos outros candidatos qualquer sinal de que podem realizar o país previsto e desejado pela Constituição Federal de 1988, pois não são, ainda que não delinquentes políticos como Moro e Bolsonaro, da altura da Constituição Federal. Lula é, não apenas da altura constitucional, como seu maior avalista.

 

 

Pietro Nardella-Dellova

(Doutor e Mestre em Direito, UFF - Universidade Federal Fluminense e USP - Universidade de São Paulo; Doutor e Mestre em Ciência da Religião PUC/SP, Professor da EMERJ – Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, Poeta, Autor, Coordenador da RDC - Revista de Direito Civil Constitucional, Membro da Accademia Napoletana)

 


 

 


martedì 15 giugno 2021

PIERRE PROUDHON E SUA TEORIA CRÍTICA DO DIREITO CIVIL, de Pietro Nardella-Dellova, Editora Scortecci, 2021


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

1.      A DIMENSÃO CONCEITUAL DA ANARQUIA E DO ANARQUISMO

1.1.    Do conceito multiface da anarquia e do anarquismo

1.1.1.                    Da violência no conceito de anarquismo

1.2.    A dimensão utópica do anarquismo

1.2.1.                    Das utopias e topias no anarquismo

1.3.   Duas principais ideias anarquistas

1.3.1.                    Dos princípios da autoridade e da liberdade

 

2.      PROUDHON E SUA TEORIA TRILÓGICA DA PROPRIEDADE

2.1.    Proudhon e sua teorização da propriedade

2.1.1.                    Aspectos gerais das obras de Proudhon acerca da Propriedade

2.2.   A crítica proudhoniana à desonra da propriedade: roubo e miséria

2.2.1.                    Droit d’aubaine: a síntese da desonra, do roubo e da miséria

2.3.   A propriedade proudhoniana como garantia da liberdade

2.3.1.                    Síntese da teoria proudhoniana:

 nem roubo nem miséria, mas igualdade e liberdade

3.      TOPIAS ANARQUISTAS E SEUS LIMITES NO KIBUTZ

3.1.    O Kibutz como topia anarquista

3.2.   A topia kibutziana versus o Mercado e o Estado

3.3.   A topia kibutziana em busca de uma nova utopia

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS