O FREI VICENTE DO SALVADOR (1630), O CRIME DE MARIANA (2015), O CRIME DE BRUMADINHO (2019), OU SOBRE UM PAÍS POBRE INTELECTUALMENTE, E MISERÁVEL CONSTITUCIONALMENTE
por Pietro Nardella-Dellova
Em 2015, quando do crime ocorrido em Mariana, crime praticado pela Vale do Rio Doce, que culminou na morte de seres humanos e destruição de Mariana e cidades vizinhas, condenei o uso da palavra "TRAGÉDIA", pois não se tratava de uma tragédia (caráter mais natural e de força maior), e sim, de um crime com responsabilidade civil, criminal, ambiental, administrativa.
Agora, o mesmo crime ocorreu em Brumadinho. Os criminosos são os mesmos, as centenas de vítimas são outras. É crime, não tragédia.
Vejam, não se trata de fruto do capitalismo (embora o capitalismo, assim como o comunismo, causem-me desgosto e profundo nojo), mas de como esse capitalismo ocorre.
No caso do Brasil, o capitalismo resume-se em: "lucro a qualquer preço - fodam-se o meio ambiente, o trabalhador, o consumidor". Isso é reforçado pelo discurso, canalha e raso, do novo governo (e do velho também). Por exemplo, a reforma trabalhista e a voracidade em fazer a reforma previdenciária, somadas ao desprezo que este governo tem pelo meio ambiente e pelas reservas indígenas, e sua associação ao crime (milícias do Rio de Janeiro) e aos ruralistas (igualmente criminosos), autorizam um tipo de capitalismo que fazem vergonha até mesmo aos países capitalistas, como, por exemplo, os países europeus.
Há critérios objetivos (e civilizados) para o capitalismo atuar. Não é o caso do Brasil. Nunca foi. O Frei Vicente de Salvador, em sua obra História da Terra do Brasil, de 1630 (eu tenho esta obra!), já denunciou o tipo de exploração que ocorria nas terras do Brasil, com exploração, destruição do meio ambiente e um rastro de destruição. Insisto: 1630 !!! Isto não mudou nada.
Estive, faz uns oito anos, na região da amazônia legal ficando ali por quase dois anos, em um projeto, e verifiquei, pessoalmente, o estado de destruição imposto pelos madeireiros, garimpeiros, pecuaristas e outros. Ao final, tive que sair, fugido, por ter recebido inúmeras ameaças.
Os casos de Mariana (2015) e, agora, Brumadinho (2019), são conexos, aliás, são praticamente os mesmos, inclusive com a denúncia do Frei Vicente do Salvador (1630). O desprezo pela vida humana, pelos recursos naturais, pelo meio ambiente, enfim, pela economia (ainda que liberal!), tudo isso, e mais, que deveria circunscrever-se à Constituição Federal.
Em síntese. O Brasil escolheu ser capitalista. É, e sempre foi capitalista (mesmo e, sobretudo, na época do Lula e Dilma - e me perdoem os idiotas que chamam Lula e Dilma de comunistas, pois nunca foram!). É, e sempre foi, liberal; sua Constituição é liberal e isso está claro em seu texto.
Ocorre que os brasil(eiros) desprezam a própria Constituição, e isso ficou claríssimo com o inconstitucional "impeachment", fruto apenas de ódio (sem qualquer conteúdo jurídico-constitucional). O impeachment nada teve de constitucional. Ficou claro com o governo Temer e, agora, com a eleição do Bolsonaro, fruto de movimento fake!
Se os brasil(eiros) vivessem com menos ódio, com mais instrução e respeito ao texto constitucional, várias coisas não estariam ocorrendo, entre as quais, Mariana (no tempo de Dilma, 2015), e Brumadinho (Bolsonaro, 2019). Bastaria fazer valer, com ética e coragem, o disposto no Artigo 170 da CF/88. Foi o que eu disse em 2015, é o que tenho dito nas minhas aulas, palestras, artigos e textos desta página, Vejam a base do meu discurso jurídico sobre economia:
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Art. 170 (da CF/88). A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente;
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital nacional de pequeno porte.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
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Mas, reconheço que falar em Constituição Federal neste país, intelectual e culturalmente miserável (com esquerda e direita formando blocos de asnos) caracteriza-me como "petista". Pobre e miserável país, gritou Frei Vicente do Salvador, em 1630. Grito eu, hoje: pobre e miserável país!
(Pietro Nardella-Dellova)
Doutor em Direito pela Universidade Federal Fluminense. Mestre em Direito pela USP. Mestre em Ciência da Religião pela PUC/SP. Pós-graduado em Literatura e em Direito Civil. Formando em Direito e em Filosofia. Professor de Direito. Pesquisador pela PUC/SP
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