Portinari, 1944
POESIA ESGOTO
Campos, campinas verdes e únicas
Na túnica da aparência despreza
A formiga pequenina que abriga
A simplicidade da natureza
A rudeza
Em que há poesia...
Mendigos, amigos da treva espessa
E humana, a insana moral dos que passam
Dos que cassam
A vida, ferida de grades,
E caçam estrelas:
Entretê-las aos olhos
Ocultando abrolhos encravados aos pés...
Não há poesia no vinco
No brinco que brilha
Na ilha iluminada das passarelas
Amarelas e cansadas
De boca vermelha: mulheres
Mal-amadas ...
Não há poesia no costume, de botões
Enfeitado, no rosto rapado,
No mosto importado,
Na cera aos pés: uniforme sem divisas,
Nem poesia nas estantes letárgicas
Nas obras mágicas com dobras empoadas
De sonhos e fadas,
Na fachada das casas,
Nas asas de vento
Do branco cimento que pesa enfim...
Há poesia chorosa e intensa
Na favela – aquarela viva –
Na barriga vazia de crianças
Sem crença
De gente que não pensa
Que fede
Que pede e mente
E procria aos ratos nos barracos
Sem espelhos
Sem vermelhos
Nem brincos alegres
Sem vinco
Na treva do esgoto aos pés...
Há poesia nas fábricas
Ricas
Na multidão que é sua
Na multidão que sua
E azeda nos ônibus acotovela
Masturba
Perturba na tinta
Urbana favela...
Ah, menino!
Como cantar o hino poético
O estético
E matar aos olhos a visão densa
De crianças coladas à lata
Esfoladas à cata de restos
Nos infestos cantos
De portas fechadas
De mortas poesias?
Como cantar a alegria se o pranto
Dos seres pedintes encobre
O tenor no nosso palco?
© Pietro Nardella-Dellova,
POESIA ESGOTO
Campos, campinas verdes e únicas
Na túnica da aparência despreza
A formiga pequenina que abriga
A simplicidade da natureza
A rudeza
Em que há poesia...
Mendigos, amigos da treva espessa
E humana, a insana moral dos que passam
Dos que cassam
A vida, ferida de grades,
E caçam estrelas:
Entretê-las aos olhos
Ocultando abrolhos encravados aos pés...
Não há poesia no vinco
No brinco que brilha
Na ilha iluminada das passarelas
Amarelas e cansadas
De boca vermelha: mulheres
Mal-amadas ...
Não há poesia no costume, de botões
Enfeitado, no rosto rapado,
No mosto importado,
Na cera aos pés: uniforme sem divisas,
Nem poesia nas estantes letárgicas
Nas obras mágicas com dobras empoadas
De sonhos e fadas,
Na fachada das casas,
Nas asas de vento
Do branco cimento que pesa enfim...
Há poesia chorosa e intensa
Na favela – aquarela viva –
Na barriga vazia de crianças
Sem crença
De gente que não pensa
Que fede
Que pede e mente
E procria aos ratos nos barracos
Sem espelhos
Sem vermelhos
Nem brincos alegres
Sem vinco
Na treva do esgoto aos pés...
Há poesia nas fábricas
Ricas
Na multidão que é sua
Na multidão que sua
E azeda nos ônibus acotovela
Masturba
Perturba na tinta
Urbana favela...
Ah, menino!
Como cantar o hino poético
O estético
E matar aos olhos a visão densa
De crianças coladas à lata
Esfoladas à cata de restos
Nos infestos cantos
De portas fechadas
De mortas poesias?
Como cantar a alegria se o pranto
Dos seres pedintes encobre
O tenor no nosso palco?
© Pietro Nardella-Dellova,
ADSUM. Ed. Scortecci, 1992, pág 16-17
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