DOUTOR? COMO ASSIM MANÉ?
(suum cuique tribuere, honeste vivere)
Em que pese o “costume” de se atribuir o título de “Dr.” a
vários profissionais (bons que sejam!), costume esse defendido com
argumentações de A a Z, entre as quais “decretos” monárquicos, primazia de
curso superior, nivelamento ou cópia estadunidense (doctor) etc.
Em que pese o costume e a argumentação, sejamos
esclarecidos, esta não é válida e cabal nem aquele se tornou um direito!
Aliás, espantosa e inacreditavelmente, "direito"
exigido por profissionais, além de bacharéis em direito e médicos, tais como,
psicólogos, dentistas, contadores, despachantes, enfermeiros, administradores.
Há, inclusive, muitos debates, alguns em jornais impressos e outros em meios
virtuais (debates tão antigos quanto o equívoco do título “Dr.”) em que uns
dizem ter mais “direito” que outros ao título de Dr.! Debate banal!
Bem, a argumentação é um tanto (e quanto) falaciosa ou tosca.
O costume é, de fato, um costume, mas não de direito e, portanto, não se
encaixa nos assim chamados “bons costumes”!
O Bacharel em Direito é mesmo Bacharel – e não Dr.! Ingresso
nos quadros da Ordem dos Advogados, portanto, com direito a Advogar é, ainda
que seja a mais linda das profissões, um Advogado – eis o título! E mais. Se
Juiz, Juiz! Se Procurador de Justiça, Procurador de Justiça! Se Delegado, Delegado!
Se Professor, Professor! Os títulos são os nomes de suas funções e,
dificilmente, tais profissionais chegam ao Doutoramento, ao Doutor!
O Psicólogo é Psicólogo! O Médico é Médico! O Nutricionista
é Nutricionista!
O título de Doutor existe, de direito, atribuído àqueles que
já sendo Mestres (em algumas Universidades de modo diverso), passam pelo exame
de proficiência em duas línguas para além do vernáculo (geralmente, alemão,
inglês, francês e italiano), cumprem créditos (disciplinas) em Universidades
reconhecidas, escrevem uma Tese absolutamente nova e inovadora e a defendem
(com aprovação) diante de uma Banca formada por Doutores! Eis, agora, sem saúde
e solitário, o Doutor!
Quem fez um Mestrado é Mestre! Quem fez uma Especialização é
Especialista!
Eu sei que muitos dos meus colegas e contatos – até mesmo os
amigos, não concordarão comigo, pois ainda estão anestesiados com o costume e
sob as névoas da má argumentação! Va bene! Continuamos colegas, contatos e
amigos, mas, o título Doutor (Dr.) cabe apenas aos que fizeram um Doutorado
que, por sua vez, não é mais nem menos que os títulos de Advogado, Médico,
Juiz, Procurador, Delegado etc.
A meu ver, é ainda o resquício do espírito lusitano do
bacharelismo que acabou por virar uma espécie de caricatura expressa em cartões
de visita, grossos anéis de formatura, colações de grau (com direito a canudo
vazio e serpentinas). Hoje, diante de um mundo mais inteligente, não é, sequer,
de bom-tom!
Diria mais, apresentar-se como “Dr.” é um tipo sutil da
arrogância de país eternamente colonizado, de estúpida superioridade social, de
analfabetismo profissional e de agressão à inteligência. Uma infantilidade -
para dizer o mínimo!. Geralmente, com um tanto de hipocrisia, os egressos (principalmente
de um Curso de Direito) chamam seu colega de “Dr.”, mas com a perceptível intenção de assim
serem, também, chamados! Bah!
Uma curiosidade à parte. Os Doutores (de direito, pela Tese,
e de fato, pela Pesquisa), em geral, não se apresentam como tais e, muito
menos, em cartões de visita! São profissionais, comumente, Professores, que,
quase em trapos e fusca, vivem orgasmaticamente entre livros, de sebo em sebo,
de giz em giz, de laboratório em laboratório, sem anéis de formatura e, por
desgraça (ou alívio), sem alianças de noivado e casamento - e fazem, neste
silêncio empoado, a diferença cultural e científica em uma sociedade que se
pretende evoluída!
Então, da próxima vez que mandar imprimir cartões de visita
ou cunhar placas oficiais, não se esqueça do princípio jurídico “suum cuique
tribuere” ou, no vernáculo, “dar a cada um o que é seu”. Se for Doutor, de
direito e de fato (não de costume ou argumentação), possivelmente o cartão e a
placa não existirão nem serão necessários, pois Doutores não têm tempo para
isso: o tesão, prazer e orgasmo estão em níveis bem superiores!
Se não for Doutor (de direito) não exija ser chamado assim
e, melhor ainda, recuse tal tratamento! Se for um Juiz, por exemplo, e receber
aquela petição com cabeçalho padrão, determine, de pronto, seja a petição
emendada! Se for Advogado, não escreva tal cabeçalho! Em um ou outro caso:
“honeste vivere” (viver honestamente)!
Mas, se quiser mesmo o cartãozinho com aqueles símbolos
“doirados”, reluzentes, ao ponto de se comunicar com o espaço, informe, com
exatidão, o que é, ou seja, seu título profissional ou acadêmico: Advogado,
Juiz, Procurador de Justiça, Médico, Psicólogo, Contador, Despachante,
Administrador, Nutricionista ou, ainda, Bacharel, Especialista, Mestre. Neste
caso, nunca, nunca mesmo, o título “Doutor”.
Se, por acaso – e por deslize do costume, argumentação, excitação
imoderada ou ejaculação precoce - já tem em mãos os cartões e placas com o
“Dr.”, não se intimide: rasgue-os todos - e arrebente as placas sob golpes de uma
marreta certa e consciente! Aliviado, corra a um boteco e bela uma cachaça, dê
um pouco aos santos e vá fazer amor pelo resto da tarde sem quaisquer títulos. É o que falta!
© Pietro N Dellova
in “DESTRUINDO MITOS E MENTIRAS”, 2000
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